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quinta-feira, agosto 17, 2006

PALAVRA DITA

JORGE SALOMÃO
um agitador cultural, multimídia e transgressor
por Cláudia Ferrari
Natural de Jequié, Bahia, no próximo dia três de novembro, Jorge Salomão completará 58* anos de inquietude, poesia e muita arte. Autor de quatro livros - Mosaical, Olho do tempo, Campo da Amérika e Sonoro - ele ainda tem dois títulos inéditos: Estrada do pensamento e Conversas de mosquitos. Compositor gravado por Cássia Eller, Zizi Possi, Marina Lima, Adriana Calcanhoto, Barão Vermelho e muitos outros nomes da MPB, Jorge prepara o CD Cru tecnológico, pela Biscoito Fino. Desde 1997, trocou a praia do Leblon pelas ladeiras de Santa Teresa.
Mas quem é esse cara?
- Eu adoro falar que sou um malabarista, porque as mentes mais tradicionais querem dar uma conotação acadêmica ao que você faz e eu sou antiacadêmico por natureza. Quando uma pessoa diz "poeta", eu digo que não sou poeta. Eu sou um malabarista. Gosto de brincar com os conceitos, com situações, essa é a minha jogada - define-se.
Jorge Dias Salomão saiu de Jequié para Salvador, indo juntar-se ao irmão Walli Salomão. Estudou Ciências Sociais, Filosofia e Direção, com Luís Carlos Maciel, na Escola de Teatro da Universidade da Bahia. Mas, segundo Jorge, ele encontrou um "Salvador primário, barroco cariado". Na época, também chegaram à capital baiana, os irmãos Caetano e Maria Bethânia e Glauber Rocha, para citar alguns desses expoentes, e todos foram se enturmando, mudando a paisagem.
Jorge abandonou a universidade em 1968 e veio para o Rio de Janeiro, e novamente ao encontro de Walli. Decretava-se no Brasil o AI-5 e os tempos inóspitos traziam malas sempre arrumadas às pressas pelos dois irmãos
- Nós ficávamos a suportar as chicotadas absurdas da ditadura. Morávamos um tempo no Rio, íamos pra São Paulo. Uns três anos nisso. Depois veio o verão de 71, onde provocamos no Rio um verão de grande liberação, com as Dunas do Barato, o Torquato Neto e várias tendências cariocas. Promovemos uma certa revolução estética. Estávamos massacrados pelo Ato 5 e começamos a nos reunir na praia, fazíamos rituais no Pier, falávamos de liberação sexual e nos concentrávamos em experiências no campo da percepção.
Jorge estava dirigindo o Luiz Gonzaga volta pra curtir, a convite de Capinam. O show foi eleito o melhor daquele ano mas Jorge, após o fim da temporada, não conseguiu trabalhar mais no Rio de Janeiro. Então, viajou para São Paulo com o Grupo Oficina e todos foram presos e torturados. O empenho de Walli Salomão conseguiu restituir a liberdade de Jorge. Porém, as atrocidades sofridas durante o período de carceragem, fizeram com que Jorge perdesse a fala e mergulhasse em profunda depressão.
O amor do irmão Walli, o carinho e total apoio dos amigos e a sua inabalável fé em São Jorge, foram, segundo o artista, os alicerces para que ele conseguisse dar a volta por cima. Jorge Salomão recuperou a voz e a alegria e, em 1976, recebeu um convite de Caetano Veloso para criar a luz do seu show no Teatro da Praia. Depois os convites se sucederam: Gil, Gal, Jorge Mautner...
Jorge Salomão juntou dinheiro e em 1977 foi morar em Nova York. Casou-se com Sonia Miranda, mãe do seu único filho, João. Ralou um bocado, esse Jorge. Carregou caixas de tomate, trabalhou em empresas de mudança.
- Eu era meio arquiteto e já ia dando sugestões para os móveis, objetos e fui fazendo muitos amigos. Depois fui trabalhar com vídeo e também estudei designer. Eu acho que a vida é isso, por mais que você esteja triste com as situações, você não pode deixar que o rancor te possua inteiramente, que a amargura te domine. - ensina.
Voltou para o Brasil em 1984, tornando-se amigo de Antônio Cícero que o estimulou a mostrar seus textos e poemas. Foi além. Criou capas de discos, cenários, escreveu para revistas especializadas em música, produção de fotografia e, com Nico Rezende, teve sua primeira experiência como compositor, com a música Noite.
Os irmãos Walli e Jorge Salomão sempre tiveram um olhar aberto para a vida. - Meu pai era sírio, veio com meu avô para o Brasil, fugindo da guerra e meu pai falava vários idiomas. Minha mãe era do sertão bravo e era poetisa e tocava bandolim. Ela hoje, tem 92* anos e é uma figura, sempre falando, discutindo com inteligência. Minha mãe é uma libertária. Meus pais sempre tiveram uma cabeça boa, era tudo tribal. Quem ia trabalhar com a gente já ficava morando e os filhos também e todos éramos criados juntos, e uma educação livre, um olhar livre.
Jorge que chegou a morar em Santa Teresa na década de 70, redescobriu o bairro em 1997 e mudou-se "com mala, cuias e muitas idéias". É ele quem revela: "Santa Teresa é um bairro muito bonito, de uma poética singular. Eu gosto muito das pessoas daqui, eu gosto da simplicidade, eu gosto desse jeito de estar no Rio de uma maneira mais simples. O amanhecer é o que mais gosto em Santa Teresa, a quantidade de pássaros cantando. E eu gosto de gente. Sem gente a gente não existe. Eu gosto de estar misturado, ser afetuoso, libertário, espalhar alegria e revolução. estamos num caos social e a gente tem que trabalhar os valores de afetividade e felicidade para o mundo. A miséria social está crescendo muito, no mundo inteiro. Tem que acontecer transformações. A miséria é estúpida. O nosso pensamento tem força e não estamos sozinhos.
* Entrevista concedida em outubro de 2004.
Todo carinho e admiração, à memória da Sra. Elizabeth Salomão, mãe de Jorge Salomão.

Um comentário:

  1. Maravilhoso Jorge!!! Vontade de te rever !!! Abraço-Carinho, Flávio Boaventura, o Boave.

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