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quinta-feira, dezembro 14, 2006

Infinita preguiça

Naomi Conte



Acordei com a certeza de que Deus não existe, e dada a vacância da posição assumi de todo pronto o posto, porque o mundo, ou pelo menos a cidade onde moro, ou só a minha quadra mesmo, não sobreviveriam mais que poucas horas à esta ausência. Na cama ainda me encontrava quando pensei em fazer uma revolução, trocar mandantes por mandados, queimar shoppings, igrejas e carros importados, com raios e trovões vindos do céu, a justiça divina de uma mente atordoada de ressaca. Tão logo me veio à mente a visão final desse vazio, me veio à lembrança a “revolução dos bichos” e virei de lado. Talvez aproveitasse somente pra cuidar do eu, de mim, então pensei em comida, bebida, mulheres, conforto, porém fosse qual fosse o trivial gozo de corpo e alma prometido, teria que me levantar, lavar o rosto e dar prosseguimento à mandos e desmandos, virei de lado novamente, a cama quente, o quarto escuro, estirei o braço debaixo das cobertas, cutuquei Deus no ombro, e mandei-o reassumir o posto com urgência.

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